Marcos Dantas, professor de Sistemas de Comunicação e Novas Tecnologias
na Escola de Comunicação da UFRJ, defendeu que o governo use a Telebrás
para constituir uma rede estatal de comunicação. Essa rede, de acordo
com o professor, seria fundamental para atender necessidades do Estado
brasileiro.
"Isso deixaria as operadoras
apavoradas, pois estaríamos subtraindo delas o riquíssimo mercado
estatal, mas hoje, se o presidente Lula manda um e-mail para um
ministro, ele passa por uma conexão privada", disse, sugerindo o
aproveitamento da rede da Eletronet, que está ociosa.
No entanto, Dantas avalia que, para
garantir o investimento em banda larga para regiões que não oferecem
lucratividade, bastaria mudar o marco legal, mediante adoção de regime
público, como é feito na telefonia fixa:
"Na telefonia fixa, as empresas são
obrigadas a cumprir metas, ter manutenção de qualidade", afirmou.
Já o economista Paulo Passarinho,
conselheiro do Corecon-RJ, considera que a Telebrás poderá funcionar
apenas como investidora, ficando esse lucrativo mercado, depois dos
investimentos feitos com dinheiro público, para as empresas privadas,
como ocorre no metrô.
Telebras vai mesmo ser um contraponto
ao cartel das teles?
Marcos Dantas - Não vejo por aí. A
questão central é quem financia. A Telebrás vai precisar de R$ 15
bilhões. Como vai conseguir operando apenas em regiões pobres? Na
telefonia fixa as teles investiram. Essa é uma questão que também estar
ligada à renda. Pode haver um sistema telefônico implantado, mas as
pessoas não têm renda. Na periferia do Rio, por exemplo, gasta-se R$ 15
por mês num pré-pago.
E no caso da banda larga?
Não há investimento porque não é um
serviço em regime público. Na telefonia fixa, sim. As empresas são
obrigadas a cumprir metas, ter manutenção de qualidade. A banda larga só
está instalada em cerca de 400 municípios, nos quais há mercado. Ou
seja, onde interessa fomentar negócios privados.
Para os demais, tem de haver regime
público, independentemente do serviço ser prestado por empresa pública
ou privada. Meu temor é que acabemos tendo um serviço público oferecido
para pessoas de baixa renda, com má qualidade, e outro, ofertado para
quem pode pagar, como os planos de saúde, para as pessoas de classe
média.
Seria o pior dos mundos. Eu disse
pessoalmente ao presidente Lula que há problemas difíceis de resolver
com o atual marco legal. Talvez tenham convencido ao presidente que a
maneira mais fácil de fazer seria recriar a Telebrás.
Mas tenho dúvidas porque, embora a
Constituição admita, a Lei Geral de Telecomunicações não prevê o retorno
do Estado a essas atividades, só trata do serviço prestado por empresas
privadas.
O gestor público só pode fazer o que a
lei permite. Não vai faltar advogado para embarreirar. Me entusiasmam
muito mais algumas mudanças na Anatel e no próprio ministério.
Por quê?
Quem será nomeado para a Telebrás?
Por sua vez, a Anatel foi um fracasso neste governo. A maior parte dos
conselheiros nomeados não foi por competência, mas por pactos políticos
de bancadas no Congresso Nacional. A Anatel virou um órgão burocrático.
Como funciona o regime público?
Há uma equação financeira segundo a
qual a remuneração das áreas lucrativas financia áreas mais carentes. É o
chamado subsídio cruzado: por determinada tarifa, posso fazer
determinado investimento. Para alavancar a banda larga, poderia ser
criado um fundo ou algo mais forte. Mesmo a Telebrás vai precisar desse
tipo de financiamento.
As teles dizem que a carga tributária
eleva o preço das tarifas. É verdade?
Não há nenhuma razão para a tarifa de
telefonia celular estar neste nível, um dos maiores do mundo. E o
pré-pago é mais alto, também sem nenhuma razão.
Pode-se até baixar o imposto, mas
jamais chegaremos a um serviço de R$ 10 para a massa de 40 milhões ou 50
milhões de pessoas que recebem Bolsa Família, por exemplo.
A tarifa do celular está cara por que
é oferecida apenas a uma parcela da população que aceita pagar e não
fazem (as teles) questão de estender esse mercado.
O governo Lula diz que as tarifas
foram estabelecidas pelo governo FH...
Com FH, as tarifas subiram mais de
mil por cento em três anos, com inflação baixa. Quando fez os contratos
de equilíbrio econômico- financeiro, FH estabeleceu regime de reajuste
baseado no IGP, no qual o dólar tem influência.
Lula corrigiu isso, criando um índice
específico para as telecomunicações, a partir de 2003. Hoje os
reajustes têm sido baixos, mas depois de terem chegado à estratosfera. O
governo pode baixar tarifas, mas depende de uma política, do aumento da
renda e também de subsídio cruzado. Com ou sem Telebrás.
Se Telebrás é desnecessária, qual o
objetivo do governo?
Ela seria muito importante para fazer
uma rede estatal de comunicação, o que deixaria as operadoras
apavoradas, porque toda comunicação de governo passaria por uma rede sob
controle direto do Estado.
Se o presidente Lula hoje manda um
e-mail para um ministro ele passa por uma conexão de uma privada. Uma
rede pública é fundamental para atender necessidades do Estado, e existe
uma infra-estrutura ociosa, da Eletronet, que poderia atender também
escolas públicas, hospitais. Mas estaríamos subtraindo o riquíssimo
mercado estatal das empresas privadas.
Por que o governo não usou a
Eletronet para isso?
A Eletronet é uma empresa que o
governo esvaziou, mas conseguiu recuperar na Justiça o controle da
fiação. Afinal, foi ele quem investiu no sistema físico.
Esse sistema poderia ser transferido
para gestão da Telebrás, começando pelas comunicações de Estado para
depois passar para as políticas públicas.
Mas a rede da Eletronet e de outras
estatais não é capilarizada, não passa na casa das pessoas. Só atende
grandes concentrações industriais e financeiras. Então, é necessário um
tremendo investimento na capilarização.
Como fazer isso?
A idéia de Rogério Santana, do
conselho de administração da Telebras, é fazer acordo direto com
pequenos provedores para usar comunicação sem fio. Eles poderiam ser
conectados à Eletronet.
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