Privatização da teles trava a expansão da banda larga no país


A Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) espera déficit para o setor de telecomunicações da ordem de US$ 33 bilhões para 2011. Ele cresce consistentemente desde o início deste século, fruto da falta de encomendas para a indústria nacional.
O chefe da divisão técnica de Eletrônica e Tecnologia da Informação do Clube de Engenharia, Marcio Patusco, quer garantir que a nova legislação para a banda larga, em discussão no governo, dê suporte ao desenvolvimento do setor: "Com a privatização, as empresas em geral têm seus destinos decididos por estrangeiros. Mas em todos os países, até nos EUA, a implementação da banda larga ficou sob a responsabilidade dos governos", afirma, lembrando que a banda larga é atendida a preços caros e tem oferta muito pequena.
Reconhecendo que entregar a responsabilidade pelo processo à Telebras foi um avanço, Patusco cobra uma política industrial mais eficiente para o setor: "A primeira iniciativa veio da Telebrás: fazer com que os leilões de equipamentos que usará para a implantação da banda larga, reservem 25% para a indústria nacional", disse, acrescentando que isso tem surtido efeito: "As empresas estão se unindo em torno de consórcios que vêm ganhando concorrências com operadores internacionais, que costumavam ganhar facilmente", informa o engenheiro nesta entrevista exclusiva.

Há desindustrialização no setor de telecomunicações no Brasil?
É bastante evidente que as empresas de forma geral tiveram diminuição dos contratos com operadoras nacionais. Isso se reflete até na quantidade de insumos importados de fora. A balança comercial na área é amplamente deficitária. Em 2011 espera-se déficit dessa industria da ordem de US$ 33 bilhões.
Ele vem aumentando ano a ano neste século, fruto da falta de encomendas que as operadoras fazem à industria nacional. Todas as compras são feitas fora do país e trazidas para cá num pacote.
A própria Abinee vem reclamando com a entidade que congrega essas operadoras no sentido de fazer ver que não existe compromisso delas com o desenvolvimento da indústria nacional. Eles respondem que trabalham com a legislação existente

O que falta, além da nova legislação?
Política industrial para a área. E a primeira iniciativa foi da Telebrás, de fazer com que os leilões de equipamentos que usará para a implantação da banda larga, tenham conteúdo nacional de 25%. Isso vem surtindo efeito. As empresas estão se unindo em torno de consórcios e vêm ganhando concorrências com operadoras internacionais, que costumavam ganhar facilmente.
A Telebrás, como eventualmente o preço nacional fica mais caro, na hora que se faz o leilão negocia quando verifica que o fabricante nacional tem preço dentro dos 25% e ainda está superior ao internacional. Verificamos que todos os participantes trazem o preço para onde a Telebrás quer, o que dá grande legitimidade ao processo.

A sociedade está dando suporte para que o governo seja mais arrojado nas negociações em torno da nova legislação para a banda larga?
Uma das propostas do clube é colocar a banda larga como serviço público. Isso tem dimensão transformadora bastante grande no quadro brasileiro de prestação de serviços. Precisamos colocar obrigações de universalização de qualidade, de tarifas mais baratas. Nada disso agrada às operadoras existentes.
Gera resistência e temos percebido que o governo dependerá do suporte que podemos dar para sua decisão. O clube e outras entidades governamentais, empresariais ou da sociedade devem também colaborar para que o governo tire o denominador comum para adotar uma lei que beneficie a todos, contrariando interesses, se for necessário.

Qual a base para a negociação?
A Conferência Nacional de Comunicação (Confecon), realizada em dezembro de 2009, aprovou 600 propostas que fizeram parte do documento que Franklin Martins, ministro de Comunicação Social no governo Lula, entregou a Paulo Bernardo, novo ministro das Telecomunicações. Tivemos um evento em Brasília e o ministro informou que estava analisando o documento do Franklin e prometeu levá-lo à consulta pública para implementar como nova Lei das Comunicações.
Nesta nova iniciativa do governo de realizar modificação no marco regulatório, a sociedade voltou a defender propostas da Cofecon. Esta semana, tivemos reunião para criar grupos de trabalho em cada uma das áreas que envolvem modificação do marco regulatório e dar suporte à discussão que haverá dentro do governo para chegar a uma lei de telecomunicações no país.

Quais as maiores falhas da legislação existente?
O Banco Mundial (Bird) fez relatório mostrando que o desempenho do PIB está associado ao desenvolvimento nas comunicações. Alto desenvolvimento nesta área acelera o PIB. Temos várias leis, muitas delas inadequadas para a época. Toda a radiodifusão hoje em dia é regida pelo Código Brasileiro de Comunicações, de 1962. Naquela época, não havia sequer TV em cores. Precisamos de uma nova lei, moderna e abrangente, que sirva de referência para o desenvolvimento brasileiro nesta área.
O clube trabalhou propostas interessantes e fez documento enviado semana passada à presidente Dilma Rousseff. Ela já acusou recebimento e estaria tomando providências. É nossa contribuição para a discussão do marco regulatório das telecomunicações no Brasil. Foi produzido por 20 engenheiros, que discutiram e garimparam medidas, voltadas para uma área de comunicações desenvolvida e para o engenheiro, em particular.

Além dos vetores sociais, a área de comunicações tem uma vertente empresarial. Como colocar um freio à ganância?
A Telebras foi reativada e cuida da implementação do Plano Nacional de Banda Larga. Com a privatização, as empresas em geral têm seus destinos decididos por estrangeiros. Queremos que o Estado seja responsável pela execução do plano, como é em todos os países, inclusive nos EUA. É preciso ter alguém cuidando dessa implantação que possa chamar as empresas locais para participar. A banda larga é atendida com preços caros e abrangência muito pequena. A Telebrás tem de trabalhar pela universalização a preços mais baratos. A tarifas de celular é a segunda mais cara do mundo. Perdemos apenas para o Marrocos.

O que diz o órgão regulador?
Em 2010 fizemos um evento colocando isso para a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que se defendeu, argumentando que a carga tributária é alta. Mas mesmo tirando o peso dos impostos, ainda ficamos em 90º lugar no ranking mundial do setor. A Abenee faz balanço anual e vem detectando que a participação do importado é cada vez maior. A fabricação de celulares, por exemplo, hoje é feita por muitos fabricantes. Eles importam componentes e exportam o que foi montado, tornando a balança do setor altamente deficitária.

Rogério Lessa

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