Ao apagar das luzes de seus oito anos de
governo, o presidente Lula assinou decreto criando uma comissão
interministerial para "elaborar estudos e apresentar propostas de
revisão do marco regulatório da organização e exploração dos serviços de
telecomunicações e de radiodifusão". Foi o terceiro decreto assinado
para o mesmo fim.
A
comissão seria integrada por representantes da Casa Civil, dos
ministérios das Comunicações e da Fazenda, da Secretaria de Comunicação
Social da Presidência (Secom) e da Advocacia Geral da União.
Representantes de órgãos e entidades da administração federal, estadual e
municipal, além de entidades privadas, poderiam ser convidados a
participar.
O artigo 6º do decreto diz que "a Comissão
Interministerial encerrará seus trabalhos com a apresentação, ao
Presidente da República, de relatório final", mas não estabelece prazo
para que isso ocorra.
O
ex-ministro Franklin Martins, da Secom, declarou à época que "a idéia
era (é) deixar para o próximo governo propostas que permitam avançar
numa área crucial e enfrentar os desafios e oportunidades abertos pela
era digital na comunicação e pela convergência de mídias.
Decorridos
quase dois meses da posse do novo governo, e apesar de se constituir em
alvo constante de acusações de censura por parte da grande mídia, não
se conhece publicamente o projeto que teria sido elaborado pela comissão
coordenada pelo ex-ministro Franklin.
Afinal, existe um projeto?
Pré-versõesAinda
ao final do governo Lula, circularam análises de pré-versões do
projeto, nas quais, em linhas gerais, se destacam os seguintes pontos,
1.
Segue diretivas da União Européia, isto é, a regulação deve ser
inversamente proporcional ao poder de escolha do usuário: quanto mais
"pronta" é oferecida a programação, maior deve ser a regulação;
2.
Incorpora as normas contidas no PLC 116 que trata da convergência das
telecomunicações com a TV por assinatura e tramita no Congresso
Nacional, desde 2007. Hoje se encontra pronto para votação no Senado
Federal;
3.
Prevê a criação da Agência Nacional de Comunicações, com poder para
regular a prestação de serviço de TV aberta, por assinatura e cinema,
cuidando dos aspectos de programação, distribuição e exibição;
4.
Altera as regras para concessões de rádio e televisão que passam a
incluir audiências públicas locais no processo de renovação e impedem
políticos com mandato eletivo de controlarem empresas concessionárias;
5.
Regula a proteção de crianças, adolescentes e de minorias e outros
setores vulneráveis, além de definir limitações para campanhas
publicitárias dirigidas a esses grupos;
6.
Prevê a instalação de um Conselho ligado ao Executivo, com participação
de diferentes setores da sociedade civil, com as funções de auxiliar no
planejamento do setor, estabelecendo um plano nacional de comunicação; e
7.
Não determina reserva de espectro para os sistemas privado, público e
estatal, nem estabelece limites claros à propriedade cruzada.
Confusão generalizadaDepois
da posse da presidente Dilma, o seu ministro das Comunicações, Paulo
Bernardo, se encarregou de dar diferentes declarações sobre o projeto,
mas garantiu que "ele não estava concluído, que seria examinado por
vários ministérios e passaria pelo aval da presidente, antes de ser
levado à discussão pública" ( "Ministro se diz contra posse de jornal,
rádio e TV na mesma região", Folha de S.Paulo; 13/1/2011).
Especialistas que participaram da elaboração do projeto também deram entrevistas confirmando alguns dos pontos listados acima. E, mais recentemente, o líder do PT na Câmara dos Deputados publicou artigo em que afirma:
"A
regulamentação do capítulo da Constituição Federal referente à
comunicação é também tarefa estratégica. Há uma chiadeira dos
proprietários dos conglomerados de comunicação, mas a matéria não pode
ser mais adiada. Um novo marco regulatório das mídias, que garanta mais
liberdade de expressão, democratize e impeça a monopolização do setor, e
garanta uma sociedade plural e democrática, é sem dúvida um dos pontos
centrais da agenda do Congresso" (Jornal da Câmara, 4/2/2011.De certa forma, instalou-se uma confusão generalizada em relação não só ao que de fato está no projeto deixado pelo ministro Franklin, como também em relação o que de fato pensa o atual governo sobre a regulação das comunicações.
A quem interessa?Um bom exemplo dessa confusão foi a manchete de primeira página do Estado de S.Paulo de 27 de janeiro: "Convergência de mídias leva governo a desistir de veto à propriedade cruzada.
Não
seria melhor para todos – antes mesmo que se transformasse em projeto
de governo e que fosse enviado à Câmara dos Deputados – se o tal projeto
fosse divulgado e os interessados participassem democraticamente de sua
discussão e fizessem sugestões para seu aprimoramento?
A quem interessa o prolongamento dessa confusão generalizada? |
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