Teles x TV a cabo: MP sustenta que Anatel não tem poder para mudar legislação


Ana Paula Lobo e Luiz Queiroz
  Convergência Digital 
 

A disputa entre as atuais prestadoras de TV por Assinatura e as operadoras de Telecomunicações, que pleiteiam o direito de ofertar o serviço de cabo por meio de suas infraestruturas, ganhou mais um round. E dessa vez, as empresas do setor de TV a cabo conseguiram o endosso do Ministério Público Federal.
Em pedido de cautelar, encaminhado pelo Procurador Geral, Lucas Rocha Furtado, o Ministério Público sustenta que não é possível classificar o serviço de TV a cabo como puramente público conforme prega, segundo o MP, o modelo aprovado pela Anatel. O pedido de representação conta a agência reguladora endossa posição defendida pelo Sindicato Nacional das Empresas Operadoras de Sistemas de Televisão por Assinatura - SETA. Decisão do TCU deverá ser divulgada em breve.
O Convergência Digital teve acesso ao pedido de cautelar encaminhado no último dia 03 de março. Nele, o procurador Lucas Rocha Furtado argumenta que:
As novas medidas preconizadas pela Agência Nacional de Telecomunicações - Anatel que representariam flagrante violação à ordem jurídica e desrespeito às deliberações do TCU podem ser assim sintetizadas:
a) inexigibilidade de licitação para exploração dos Serviços de TV a Cabo, já que não se deve mais considerar qualquer limitação ao número de prestadores em cada área;
b) eliminação do limite ao número de prestadores por área de concessão, à míngua de estudo técnico específico e sem as alterações normativas que seriam exigidas; e
c) cobrança apenas do valor de R$ 9.000,00 referente ao custo administrativo pela expedição do serviço, ao contrário do que teria ocorrido anos atrás nas licitações para outorga das concessões de TV a cabo, quando o Estado arrecadara o expressivo montante R$ 391.015.779,82.

Rejeitando as mudanças aprovadas pelo Conselho Diretor da Anatel, em novembro do ano passado, o Procurador Geral do MPF adiciona:

"O Ministério Público entende que as questões trazidas ao nosso conhecimento reclamam a pronta atuação do Tribunal, com vistas a assegurar a observância da legislação em vigor, da autoridade das decisões do TCU sobre o assunto e do princípio da segurança jurídica do setor regulado, razão por que solicito a presente cautelar".

O procurador sustenta ainda que o setor de TV a cabo segue sendo regido por duas legislações - a Lei Geral de Telecomunicações, geral, e a Lei do Cabo, específica.

“As Leis nos 9.472/1997 (Lei Geral de Telecomuicações) e 8.977/1995 (Lei do Cabo) passaram a disciplinar conjuntamente o serviço de TV a cabo. A primeira, como lei geral. A segunda, como lei especial. Daí, forçoso é concluir que as questões atinentes ao serviço de TV a cabo devem sempre ser examinadas sob a luz dessas duas normas, mediante interpretação sistêmica, que harmonize as regras nelas dispostas. Despiciendo lembrar, ainda, que, em quaisquer casos atinentes ao serviço de TV a cabo, deverá prevalecer o normativo especial sobre o geral sempre que esses se apresentarem conflitantes, desde que, obviamente, essa solução não viole a Constituição Federal”.

Na sua argumentação para pedir a cautelar junto ao TCU, Lucas Rocha Furtado relembra o voto de ministro do próprio tribunal sobre o tema, especialmente, sobre o fato de TV a cabo ser um serviço público.

"A aplicação subsidiária da LGT na regência dos serviços de TV a Cabo foi reconhecia pelo Relator do Voto que conduziu ao Acórdão n.º 231/2003-Plenário, Ministro Augusto Sherman Cavalcanti, acolhendo os fundamentos do parecer do Ministério Público. Isto posto, ficou claro para mim que dúvidas não poderia haver em relação à incidência, nos procedimentos de outorga de concessão dos serviços de TV a cabo, do que dispõem os artigos 11 a 15 da Lei nº 8.977/1995 , a Lei Geral de Telecomunicações e as normas inferiores de elaboração da Anatel. É evidente, porém, que as regras publicísticas estatuídas na Lei n. 8.977/1995 não permitem classificar o regime de prestação dos serviços de TV a cabo como puramente público. Como já destaquei no referido parecer, “(...) esse tipo de serviço carece da essencialidade característica dos serviços que reclamam ações efetivas no sentido de garantir, até mesmo mediante a intervenção do Estado, sua existência, universalização e continuidade”.

O procurador também contesta o preço de R$ 9000,00, fechado pela Anatel para a concessão da outorga.

"É importante ressaltar que a nova sistemática levada a efeito pela Anatel no tocante à cobrança do valor simbólico de R$ 9.000,00 pela concessão poderá gerar grande instabilidade jurídica ao setor, tendo em vista que não ficou esclarecido como será a convivência entre as novas outorgas e as que foram concedidas sob o sistema anterior. A entrada de novas prestadoras a custos ínfimos se comparados aos incorridos por aqueles que desembolsaram consideráveis somas de capital nas licitações anteriores realizadas para os serviços de TV a cabo poderá gerar contentas judiciais indesejáveis. Assim, enquanto não definido o tratamento a ser conferido às outorgas em vigor, seria de todo temerária a concretização das providências anunciadas pela Anatel"

TV a Cabo: decisão da Anatel

No dia 24 de novembro do ano passado, o Conselho Diretor da Anatel aprovou a revisão do regulamento da TV a cabo, segundo o proposto pelo conselheiro João Rezende. Houve três mudanças relevantes, sendo a mais importante delas, o fim da limitação do número de outorgas por área de prestação do serviço. Ou seja, poderão atuar no mercado de TV a Cabo tantas quantas forem as empresas interessadas em cada região.

A definição da área de prestação também mudou. No lugar de uma outorga por município, a empresa poderá preferir ter uma outorga por área de numeração – ou seja, uma mesma licença para a área do DDD 11, 21, 61, etc, o que significa cobrir mais de um município com a mesma outorga. A agência também definiu que o custo de cada outorga será o preço administrativo – R$ 9 mil – além do cumprimento de condicionantes. Essas condicionantes serão definidas no Regulamento de TV a Cabo, em análise pelo conselheiro João Rezende, principal defensor na Anatel da abertura total desse mercado.

Ainda nesta mesma reunião, a agência aprovou a retirada da cláusula dos contratos de concessão da telefonia fixa em que determinava que concessão ou autorização de serviço de TV a Cabo “não será outorgada nem transferida pela Anatel à concessionária, suas coligadas, controladas ou controladora”. E, certamente, neste ponto está todo o motivo da discórdia entre as empresas de TV por Assinatura e as teles, que disputam o negócio.

O grande entrave, porém, é a demora da assinatura dos contratos de renovação de concessão - estavam previstos para 31 de dezembro e foram adiados para o dia 2 de maio, para se tentar um acordo com o governo para a inclusão de metas de Universalização da Banda Larga no modelo - questão que traz divergência entre as partes.

A assinatura dos contratos depende desse acerto. Além disso, apesar de a Anatel considerar que as decisões tomadas já poderão abrir o mercado de cabo a partir da aprovação de um novo regulamento, há quem defenda que precisa haver uma alteração na Lei do Cabo. Nesse caso, seria necessário, por exemplo a aprovação do PLC 116 no Senado - ainda sem data para acontecer.

Ainda assim, o conselheiro João Rezendo já afirmou que a partir do novo regulamento, previsto para meados deste ano, as concessionárias de telefonia já poderão atuar no mercado de TV a cabo, tanto que pretende começar a emitir as autorizações a partir, no máximo, do segundo semestre.

Atualmente, as teles estão autorizadas a atuar por meio do DTH - sistema de transmissão via satélite. E fato é: Com a entrada das teles nesse segmento, o ranking das operadoras mudou e o DTH domina, agora, o número de assinantes do serviço no Brasil.

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